segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Origem e primeiros registros

Estes textos são dedicados à história, aos personagens (muitos heróis verdadeiros) e aos descendentes de uma das famílias pioneiras da América.

Introdução e considerações etimológicas
Os Astete são de origem espanhola e carregam um velho sobrenome vasco-castelhano. O primeiro registro de sua presença é do século XV, em Santo Domingo de la Calzada (atualmente em La Rioja). Nas primeiras décadas do século XVI estavam também em Salamanca, na província e na cidade de Valladolid (onde eram, aparentemente, numerosos) e na província de Burgos.
Reproduções dos prováveis Brasões dos Astete
À esquerda conforme descrito nos tratados de heráldica .
À direita o brasão do Caballero de Santiago Manuel de Arce Otálora y Astete
O nome “Astete” parece ser um toponímico de influência Basca, o que faz pensar numa origem realmente antiga, anterior à consolidação do idioma castelhano nessas províncias. Pareceria tentador supor que haja relação com a palavra "Aste", que em basco moderno quer dizer "dia de trabalho" ou "semana", mas é pouco provável que seja a suposição correta, por carecer de sentido toponímico. Há outras hipóteses mais prováveis. Na língua dos Bascos, "Arte" significa carvalho, e "eta" ou "ete" proximidade, localização. A mesma interpretação se faz, no entanto, para "Arteaga", outro sobrenome basco, o que gera dúvidas em relação à origem de "Astete". Haveria realmente plausibilidade para a hipótese de que "Arte" tenha sido suavizada para "Aste" com o tempo? Alternativamente poderíamos considerar a raiz "Asto", utilizada para animais de carga. Portanto, pode-se especular que o nome Astete possa ter sido atribuído a pessoas que viviam próximas a um local com muitos carvalhos ou onde se criavam animais de carga. O momento em que o termo deixou de ser uma referência de origem e passou a denominar uma família não é possível precisar.

Origem
Há dificuldades óbvias em se estabelecer o local de origem ancestral de qualquer família. No entanto, a teoria que julgo ser mais consistente é a da origem burgalesa (de Burgos) e riojana (de la Rioja), mais precisamente em Quintanaélez, localidade de pequenos fidalgos nos verdes campos e arroios da planície de “La Bureba”, e em Santo Domingo de la Calzada, cidade tradicionalmente ligada à "rota vasca" do Caminho de Santiago. A região das duas localidades, no nordeste da província de Burgos e oeste de La Rioja, era ocupada por povos de língua basca na antiguidade, foi o berço do reino de Castilla e é a mais próxima dos teritórios bascos atuais, tendo sempre sido vizinha do Reino de Navarra (Pamplona).












A região pode ser considerada como o núcleo original do que veio a ser o Reino de Castela, a principal entidade política por traz da origem da Espanha Imperial e mesmo do país atual. A presença imemorial de povos vascos, a colonização romana (construtores da "calzada", uma estrada pavimentada titpicamente latina) e a disputa de seu território pelos reinos de Navarra e Castela (com a vitória final do último) marcam sua história, tanto quanto as rotas comerciais entre a Espanha cristã e o resto da europa e as de peregrinação religiosa. Ao longo dos tempos, principais referências urbanas foram a antiga villa de Briviesca e a gloriosamente histórica cidade de Burgos (distante uns 50 km tanto de Quintanaélez como de Santo Domingo).

Burgos é conhecida como “la cabeza de Castilla”, por sua posição setentrional e importância histórico-militar. É de Vivar, na província, o lendário Rodrigo Diaz, “El Cid Campeador”, sem dúvida o mais famoso personagem da idade média espanhola. El Cid comandou no século XII as forças cristãs do Reino de Castela contra os Mouros, nos primórdios da “Reconquista”. Sua história é um dos ícones do cavalheirismo medieval, e não deixa nada a desejar em relação ao mito de Artur e seus cavaleiros da távola redonda. Com a diferença que Rodrigo Díaz foi definitivamente real, e nunca usou uma coroa. El Cid e sua esposa Jimena, estão sepultados sob o transepto da Catedral Gótica de Burgos.



Burgos e sua Catedral (nas fotos eu e minha esposa Carolline)



Burgos foi fundada no ano 884, pelo conde castelhano Diego Porcelos, vassalo do Rei Alfonso III das Astúrias. Era um bastião militar fortificado e foi o primeiro front cristão contra os mouros de “Al Andaluz”, como foi chamada a Espanha sob domínio árabe desde o século VIII. Foi a primeira capital do Reino de Castela, antes de perder o posto para Valladolid e Madrid. Passa por Burgos o milenar “Camino de Santiago” onde os peregrinos cristãos eram protegidos pelos “Caballeros de Santiago” em sua romaria de Roncevales até Compostela, para venerar as relíquias do apóstolo Tiago “Maior”, fato que originou a única cruzada em território europeu.
O argumento a favor de que os Astete são originários da região a leste e nordeste de Burgos se baseia em registros de sua presença como cidadãos de Santo Domingo (no século XV) e como antigos "fidalgos de sangue" em Quintanaélez (pelo menos três gerações documentadas ao longo do século XVI). A hipótese alternativa para o local de orígem é Valladolid. São dessa província a maioria dos documentos oficiais onde são citados os Astete ao longo do século XVI. A raiz basca do nome, no entanto, favorece um pouco mais a área de influência de Burgos, especialmente as montanhas ao norte.

Primeiros registros
O primeiro documento onde é citado um Astete, passível de ser encontrado na Web, é uma citação de Miguel Astete como alcalde ordinario de Santo Domingo de la Calzada, em 1466, encontrada no livro "Colección Diplomática Calceatense", onde em conjunto com o também alcalde Diego Lopez de Orio ordena que se reconheçam e recompensem os serviços prestados ao Rei pelos cidadãos de Santo Domingo e por seu conselho. O segundo é uma peça jurídica. Trata-se de um processo de Gracián Astete, “alcalde” (prefeito) de Fuensaldaña, na província de Valladolid, contra Francisco de Agüero, corregedor de Becerril. Tal documento se encontra nos arquivos da “Real Chancilleria de Valladolid” e data de 1517. Don Gracián voltaria a recorrer ao tribunal em 1519.
Em 1521, Pedro Astete é citado como “alcalde” e adiministrador da fortaleza de Barcial de Loma (Valladolid). Foi casado com Ana de Ulloa, da família dos Marqueses de La Motta, e seu descendente Melchor de Astete foi fidalgo de Quintanaélez (segundo informações averiguadas e fornecidas por Carlo Gamarra Astete).
Em 1537 é registrado, na província de Salamanca, o nascimento do padre jesuíta Gaspar Astete, personagem que será comentado adiante.
Em 1548 Juan Bernal Astete recebe licença para viajar para o vice-reino de Nueva España, onde hoje se localizam a América central e o México. Não há notícias de que lá tenha realmente chegado ou se estabelecido.
Em 20 de setembro de 1553, Dona Mencía Fernandez e seu marido, Miguel Astete, fundam um “mayorazgo” (espécie de direito de primogênito de famílias ricas) para seu filho Lorenzo Astete, em Valladolid.
Arquivos da Igreja Católica, disponibilizados pelo Family Search da Igreja Mórmom americana, contêm os seguintes registros: em 28 de junho 1536 ocorre o batisado de Antonio Santillana Astete na igreja de San Miguel de Valladolid, sendo os pais Antonio Santillana e Maria Astete; em 01 de fevereiro de 1568 é batizada Ana Astete, na igreja de San Andrés de Valladolid, filha de um Astete cujo nome exato não foi descrito e de Juana Matia; em 12 de dezembro de 1570 ocorre o batismo de Miguel de Astete Monroy, filho de Lorenzo Astete e Luísa de Monroy, na igreja de San Miguel de Valladolid; 29 de maio de 1571 é a data do batizado de Dona Antonia Astete de Castro, filha de Miguel Astete e Juliana Castro, na igreja de San Nicolas de Bari, em Valladolid.
Em 30 junho de 1578 casaram-se, em Miraveche (Burgos), Melchor de Astete de Ulloa e Petronilla de Zárate. Don Melchor parece ser o fundador da Casa de Quintanaélez, dos “hidalgos” da família Astete.
Chama a atenção que tantos membros da família venham a surgir, quase simultaneamente, como figuras proeminentes e autoridades na Espanha do século XVI. Não se trata de caso isolado, parece que gozavam, de forma de geral, de confiança política, riqueza e acesso a cultura. O que lhes teria conferido tanto prestígio? Considerando os fatos políticos e militares do Reino de Castela, nos séculos XV e XVI, pode-se especular que tenham prestado serviços relevantes à coroa dos Reis Católicos, Fernando de Aragão e Isabela de Castela, e de seu herdeiro Carlos I. Entenda-se por “relevantes” nessa época, fundamentalmente, serviços militares.

Hidalgos e Caballeros

Hidalgos

Ser um fidalgo na Espanha do século XVI não chegava a ser um fato tão significativo quanto na França ou na Itália da mesma época. Recebiam título de “hidalgo” pessoas às quais interessava aos reis espanhóis retribuir por seu apoio político, militar ou financeiro ou simplesmente por terem muitos filhos homens para servir ao exército. Por parte dos agraciados com o título de fidalgo, interessava o fato de que este os desobrigava de pagar impostos sobre a posse de terra, entre outras vantagens. Num reino com um imenso exército permanente e em guerra há séculos, como no caso de Castela, não é surpreendente que tenham sido tantas as famílias de fidalgos. Mas foi na ascensão do império espanhol dos séculos XVI e XVII que esta orgulhosa pequena nobreza fez a diferença, ao se tornar a essência do oficialato da imbatível infantaria espanhola e mais fiel repositório de suas tradições militares. Isto foi ainda mais verdadeiro entre os vascos e seus descendentes, em verdade espanhóis de primeira hora, participantes de todas as ambiciosas empreitadas da aurora do Reino de Castela ao ocaso do Império. Se dizia que eram «a veces cortos de razones pero siempre largos de bolsa y espada». Foi nesse contexto histórico e nessa intríseca relação com a guerra e a conquista colonial que surgiram os fidalgos da famíla. Os Astete foram, sem dúvida, fidalgos modestos (mas não pobres) em Burgos, e foram realmente ricos em Valladolid. É citada a casa de Salamanca, mas não foi possível encontrar nenhum nome documentado. Os arquivos da Real Chancilleria registram que, em 1560, Alonso Astete, de Tudela de Duero, fez um “pleito de hidalguía” frente à “Sala de Hijosdalgo” de Valladolid, sendo o título a ele concedido. É citado que, ainda nesse ano, fez o mesmo Lorenzo Astete. Foram os primeiros “nobres” da família que se têm notícia.

Caballeros de Santiago

A Ordem Militar de Santiago foi, ao lado dos Cavaleiros da Calatrava e Alcântara, um dos grandes pilares de apoio da força bélica cristã na Espanha medieval, especialmente no caso da coroa sob os “Reis Católicos”. O título de “Caballero de Santiago” era inicialmente concedido a nobres de antiga origem, que se distinguiam pela bravura no combate ao mouros. A ordem era similar a outras do período medieval, como os Templários ou os Cavaleiros do Hospital, e foi quase tão poderosa quanto estas. No final do século XV, por pressão de dos reis Isabela e Fernando, o Papa passou a regência da ordem para a coroa da Espanha. Desde então, os títulos de “Caballero” passaram a ser distribuídos segundo o interesse político dos reis espanhóis. Permaneceu, no entanto, a exigência de se provar que o candidato a Cavaleiro de Santiago tinha “pureza de sangue”, ou seja, nunca tivesse vivido de trabalho braçal ou artesanal, nem mesmo bancário, uma possível barreira para que judeus e descendentes de mouros não pudessem se qualificar. As exigências de “pureza” de sangue se estendiam até aos quatro avós. Os “caballeros” eram identificados pela insígnia da cruz em forma de espada.

Detalhe da fachada do Monastério de San Marcos em León

Os Astete tiveram membros na Ordem de Santiago, na de Alcantara e na da Calatrava, sendo Andrés Astete y Zárate, de Lima (vice-reino do Peru) o último “caballero” conhecido da família, conforme documento de um processo de 1700 a 1705, arquivado no Consejo de Ordenes do Archivo Histórico Nacional da Espanha.


As linhagens nobres dos Astete e a chegada à América

São as Casas Solares de Valladolid e Quintanaélez as principais linhas de fidalgos dos Astete, e são estas as notícias de suas sucessões:

Valladolid

Da casa solar desta cidade procedeu :


I. Lorenzo de Astete, natural de Valladolid, foi reconhecido como "hidalgo" em 1560, e contraiu matrimonio com Luisa de Monroy, da mesma cidade. Deste enlace nasceu:


II. Miguel Astete de Monroy, batizado em 12 de dezembro de 1570 na Igreja de San Miguel, em Valladolid, onde teve duas casas principais na “plazuela del Conde de Nieva”. Don Miguel Astete Monroy foi morador de Villamuriel, próximo a Palencia, onde teve uma fazenda, e foi reconhecido como “Noble Hijodalgo”. Casou-se com Ana María de Villapadierna y Pereira, batizada em Madrid em 1 de maio de 1566, de família originaria de Salamanca (filha de Lope de Villapadierna e de Beatriz Pereira).

Foram pais de:

1.º Juan Antonio Astete de Monroy y de Villapadierna y Pereira, batizado na Igreja de San Miguel em Valladolid em 27 de janeiro 1599, foi Caballero de Santiago, em cuja ordem ingressou em 15 de Janeiro de 1641. Foi capitão de infantaria dos famosos "Tercios" espanhóis, lutou com distinção na Batalha de Rocroy contra os franceses, e morreu combatendo na Holanda a serviço de S. M. El Rey de España.

Tercios espanhóis em ação em gravuras do século XVII


Além de sua trajetória como militar, Juan Astete Monroy foi, no entanto, também um poeta, amigo de Lope de Vega, para quem compôs os seguintes versos fúnebres que fazem parte dos Sonetos de España:

“El grande, el raro, el solo, el peregrino

admirado esplendor del suelo Hispano,

hoy a la muerte satisfizo humano

las sospechas que tuvo de divino.”

Trecho de “A la muerte de Lope de Vega” Juan de Astete Monroy

2.º Beatriz Astete de Monroy y de Villapadierna, da qual segue a linha de sucessão.


III. Beatriz Astete de Monroy y de Villapadierna, viu o nome de sua família correr o risco de se extinguir com a morte do seu irmão Juan. Ao mesmo tempo, tornou-se uma rica herdeira ao receber o mayorazgo, fundado por seus bisavós Miguel Astete e Mencía Fernandez, que cabia a seu irmão. Foi batizada em Valladolid em 13 de Dezembro de 1608, e em 1652 teve que provar sua limpeza de sangue perante o Consejo de Órdenes, para ter reconhecido seu casamento (realizado em 15 de Janeiro de 1643 na Igreja de San Miguel) com o Caballero de Santiago Juan Arce y Otalora. Juan de Arce foi Oidor de la Chancilleria de Valladolid, chegou a ser conselheiro da corte de Castela e era membro de uma aristocrática família de La Rioja, de ascendência burgalesa e guipúzcoana. Beatriz e seu marido foram responsáveis pela sobrevida do sobrenome Astete da casa de Valladolid através de seus filhos:

1º Manuel de Arce Otalora y Astete, que segue a linha de sucessão.

2º Diego Esteban de Arce y Astete, corregedor de Ávila e Caballero de Alcântara (título concedido em 1664).

3º José Antonio de Arce y Astete, Caballero da Órdem de Calatrava (título concedido em 1664).

IV. Manuel de Arce Otalora y Astete, foi batizado em Oviedo em 28 de Agosto de 1644, ingressou na Ordem de Santiago em 1657. Foi um destacado magistrado, como seu pai, atuando como juíz criminal na corte de Valladolid e como corregedor de Guipúzcoa. Integrou o conselho de Castela de 1690 a 1705. Sua filha Tereza desposou um aristocrata de Segóvia, Don Antonio del Sello em 1710. Don Manuel depositou seu brasão de armas na capela dos Astete Monroy, na extinta Igreja de San Miguel em Valladolid.


Real Iglesia de San Miguel y San Julián

A paróquia de San Miguel, a mais antiga de Valladolid, é a primeira referência de relacionamento da família Astete com um templo específico, por isso sua atual igreja é considerada para nós um local de devoção. Para os Astete das Américas, em passagem pela Espanha, é mandatório ali orar, receber a bênção e depositar o dízimo. É sem dúvida uma capela belíssima, com um grande acervo astístico.

A história da família com essa igreja começa no século XVI, quando em 1536 Maria Astete e seu marido Antonio Santillana batizam alí seu filho, Antonio Santillana Astete. Uma tradição no entanto só começou a se formar quando Miguel Astete de Monroy foi nela batizado. Don Miguel teve alí uma capela principal que fazia parte do seu "mayorazgo", sendo também o local do sepultamento. A partir de então a Paróquia de San Miguel passa a registrar a realização de batizados e casamentos de descendentes de Don Miguel e outros Astete de Valladolid. Como era costume na época, os Astete Monroy tiveram seu brasão num dos contrafortes da igreja, entre os dos demais patronos. O casamento de Teresa de Arce Astete Arrieta Monroy com Don Antonio del Sello Marquez de Bracamonte, em 18/06/1710, possivelmente encerra a tradição. Por volta de 1750, a igreja de San Miguel se encontrava em abandono, e por seu mau estado de conservação acabou por ser demolida. Por este motivo a paróquia de San Miguel acabou por ser transferida para o edifício da antiga Igreja de Santo Inácio de Loyola, a 100 metros dalí, que havia sido expropriada dos jesuítas quando estes foram expulsos da Espanha. Abrigando também a paróquia de San Julián, a antiga capela jesuíta do século XVI passou a ser chamada de "Real Iglesia de San Miguel y San Julián", sendo mantida pela coroa espanhola.


Burgos

A “Casa Solar” de Quintanaélez foi erguida onde provavelmente viveram os ancestrais imemoriais dos Astete. Quem vai à região de “La Bureba” quase pode sentir o peso dos séculos passados ali. São campos planos e verdes, entrecortados por inúmeros riachos que desguam no rio Oca e, finalmente, no Ebro. Circundando esta região, que já foi conhecida como o “celeiro de Castela” por sua antiga e pujante agricultura, vemos ao norte e a leste as montanhas brancas que os Astete tinham como paisagem, os Montes Obarenes.

Obarenes vistos do Valle de la Bureba



É impossível não vê-los contrastando com o campo verde. Deve ter sido esta a imagem que levaram de sua terra, quando cruzaram o mar para não mais voltar: foi daqui que saiu o ramo que fundou a família na América. A Bureba sempre esteve no “Caminho de Santiago”, e é a porta de entrada da Europa para o antigo “Reyno de Castilla”, protegida a leste pelo desfiladeiro de Pancorbo, conhecido como “as Termópilas espanholas”. Para além de Pancorbo chegava-se ao reino de Navarra (parte do que hoje se conhece como "País Basco") aos Pirineus e, finalmente, à França. Em direção ao sudoeste encontramos “La Poza de la Sal” e suas antigas salinas protegidas, do alto de um penhasco, pelo “Castillo de los Rojas”. Do castelo se vê todo o Valle de la Bureba, a leste e ao norte, e o mesmo castelo guarda, do lado sudoeste, a estrada e a estreita passagem vinda do Páramo de Masa, elevação que dava acesso ao restante de Burgos.

Castillo de los Rojas (Poza da La Sal) e sua vista do Valle de la Bureba (com Carolline)



O Castillo é dos séculos XI e XII e certamente impedia o acesso à única passagem segura para expedições armadas à região. La Bureba foi sede de um dos primeiros Bispados católicos da Castela, e foi em Briviesca que foi criado o título de “Príncipe de Astúrias” para o herdeiro da coroa, que existe até hoje.

Quintanaélez (com vista para o Páramo de Masa)

São estas as informações que temos sobre a sucessão da Casa Astete de Quintanaélez:

I. Melchor Astete de Ulloa, foi Regente dos “Hijosdalgo” em 1598, 1613 e 1632, e “Alcalde de los Hijosdalgo” em 1628. Foi cobrador de rendas e procurador do "Cabildo" de Potosí em Madrid. Viveu parte de sua vida em Salamanca. Casou-se em Miraveche, a poucos quilômetros de Quintanaélez, em 30 de Junho de 1575 com Petronila de Zárate, nascendo desta união:

1.º Bartolomé Astete de Ulloa y Zárate, que segue a linha de sucessão,

2.º Antonio de Astete de Ulloa y Zárate, prefeito dos fidalgos de Quintanaélez en 1636.

3.º Gaspar Astete de Ulloa, funcionário real ao lado de Bartolomé Astete no vicerreino do Peru.


II. Bartolomé Astete de Ulloa y Zárate, é o fundador da família Astete das Américas. Dele descendem direta e indiretamente pessoas que vivem hoje no Peru, na Bolívia, no Chile, Argentina, México, Brasil e Estados Unidos, isto se consderarmos apenas os países onde são freqüentes. “Don Bartolomeu”, como é conhecido pelo ramo brasileiro, foi batizado em Miraveche em 30 de Março de 1578. Foi reconhecido como fidalgo nos censos (Padrones) de Quintanaélez em 1598 e 1613. Em 1598 lançou-se ao mar, rumo ao Peru, e começou a servir em 1600 como “Gentilhombre” (auxiliar direto e protetor de autoridades e comandantes) lotado na “Armada de la Mar del Sur”. Como militar chegou ao cargo de “Teniente Capitán General” do Peru. Consta nos registros da “Casa de Contratación” dos “Archivos Generales de Índias” que Don Bartolomeu foi nomeado, em 23 de Março de 1613, administrador e regente das minas da região de “Charcas”, no alto Peru, que hoje é boa parte da Bolívia. Foi seu desempenho como “correjidor” de Charcas e administrador das minas de Potosí, a maior jazida de prata do mundo à época, que fez seu prestígio político.

Minas de Prata em Potosí em gravura de 1715

Em todos os documentos em que é descrito, Don Bartolomeu é citado como um habilíssimo administrador e político astuto. E foi graças ao grande senso de oportunidade que acabou por sufocar em 1625, com muitas mortes e prisões, a rebelião dos “Vicuñas”. Este era um grupo de mineiros locais que, em sua richa com os “Vascongados” desde 1622, acabaram por se tornar bandoleiros e criar grave ameaça à soberania espanhola sobre o alto Peru. A Don Bartolomeu não restou inimigo, e conta-se que se tornou tão poderoso que era capaz de mandar interceptar cartas de seus raros detratores, antes que chegassem à Espanha. Foi então nomeado “Contador de las Cajas Reales de Lima”, cargo que correspondia a ser o secretário da fazenda de todo o Vice-Reino do Peru. Exerceu o cargo provavelmente a partir de 1634 e assinou os registros contábeis até 1662. Durante seu longo mandato enfrentou, certa vez, acusação do Vice-Rei de irregularidade contábil, tendo sido processado e afastado do cargo, junto com o contador real Sotomayor, de 1650 a 1654. Tinha, até então, um currículo ilibado, e já demonstrara, longamente, sua lealdade à coroa bem como seu caráter reto, o que lhe valeu uma meteórica carreira militar e burocrática. Se manifestaram em sua defesa diversas autoridades peruanas e de Potosí, o que contribuiu para que fosse reconduzido ao cargo e inocentado. Porém, as denúncias eram de fato verdadeiras, como de resto foram comprovadas para praticamente todos os oficiais do tesouro e corregedores do vice reino, até as reformas dos Bourbon, no final do século XVIII. Segundo os historiadores do período, como Kenneth Andrien, no momento em que a coroa espanhola passou a vender os cargos de corregedores e mesmo de oficiais das “Cajas Reales” para cidadãos do vice-reino, estes sentiram ser mais conveniente favorecer os contribuintes locais e fortalecer suas alianças do que defender, por meio das armas, os interesses de um Rei do outro lado do mar. Os próprios oficiais exploravam como particulares as minas e outras fontes de riqueza, maquiando depois registros contábeis para não pagar impostos. Este fato, ao lado das guerras religiosas do século XVII, explicam o declínio do império espanhol. Os trágicos acontecimentos da guerra dos Vicuñas em Potosí, marcados por dezenas de assassinatos de espanhóis, certamente fizeram Don Bartolomeu entender a delicada posição de uma autoridade real no vice-reino, e parecem tê-lo feito “optar” pela política local, inaugurando uma controversa tradição. A grande riqueza e a influência de Don Bartolomeu no Peru fizeram com que vários outros membros da família, da casa de Burgos (praticamente toda, aparentemente) e de Valladolid, se transferissem para o Perú ainda no século XVII. Lá se dedicaram à mineração e à atividade burocrática, e se consolidaram como uma família muito proeminente e progressivamente numerosa. Não se sabe ao certo quando faleceu Bartolomé Astete de Ulloa, mas a julgar pelos registros contábeis que assinou, viveu além dos 84 anos. Casou-se em duas ocasiões: a primeira com Juana Barahona de Loaysa, e a segunda em Lima em 24 de Agosto de 1639, com Inés Bravo de Zárate y Verdugo, natural da mesma cidade (filha de Lorenzo de Zárate e de Dona Inês, da aristocrática família Verdugo). Do segundo enlace nasceu:


III. Melchor de Astete y Zárate, batizado em Lima em 31 de Janeiro de 1648, que casou na “Ciudad de Los Reyes” (Lima) em 29 de Maio de 1664 com María de Zárate y Ulloa, batizada em Lima em 25 de Agosto de 1650 (filha de Andrés de Zárate e de Isabel de Ulloa, ambos naturais de Lima). Deste matrimonio nasceu:


IV. Andrés de Astete y Zárate, batizado em Lima em 25 de Novembro de 1669, Capitão da “Compañía de Arcabuceros” e “Caballero de la Orden de Santiago”, na qual ingressou em 31 de Outubro de 1704.


O Padre Astete

Natural de Coca de Alba, província de Salamanca, onde nasceu em 1537, Gaspar Astete foi, sem dúvida, o mais conhecido personagem da família. Segundo a historiadora portuguesa Maria de Lurdes Fernandes (da Universidade do Porto), entre outras fontes, começou sua vida monástica a 1 de Julho de 1555 e foi ordenado sacerdote em 1571. Foi professor de latim, ministro e mestre de noviços da Província de Castela, confessor e pregador, vice-reitor e reitor do colégio de Burgos e reitor do de Villímar. “São dados muito sumários, embora forneçam importantes indicadores do seu peso institucional e pastoral. Será, sobretudo, através das suas obras que poderemos tentar compreender o esforço pastoral deste jesuíta, nos importantes anos 90 do século XVI” (M.L. Fernandes - A disciplina do comportamento moral e social; Gaspar Astete e seu programa de formação da juventude cristã). Ao se referir às obras literárias do padre Astete, Fernandes está falando principalmente do célebre Catecismo de la Doctrina Cristiana escrito em 1566 (originalmente “Doctrina Cristina e documentos de Crianza”), obra que teve mais de 600 edições somente até o século XIX, em praticamente todas as línguas européias. Ao lado do catecismo do padre Ripalda, “el Astete”, como é chamado o livro do Padre Gaspar, foi o principal instrumento doutrinário popular da Contrareforma Católica (reação católica às críticas oriundas da Reforma Protestante) e da evangelização do novo mundo. O catecismo e outros livros do Padre Astete tratam da conduta social e moral dos fiéis católicos, em todos os seus papéis e situações sociais, principalmente na família. Foi claramente a principal síntese do que os católicos, principalmente de origem humilde, viriam a considerar como certo ou errado em termos de moral cristã antes do século XX, a ainda se vê sua influência nas tradições católicas ultraconservadoras, como na minoria (em meio ao predomínio protestante) dos Estados Unidos. Em suas obras, Gaspar Astete se preocupou em dar formato, entre outras coisas, ao papel dos pais e suas responsabilidades para com seus filhos, bem como dos deveres e dos ideais de bom comportamento e obediência dos filhos. A linguajem singela e clara acabou por cativar gerações de católicos. Foi um dos exemplos da firme vocação jesuíta para a educação, e um dos exemplos pioneiros de preocupação com uma educação cristã das crianças, baseada no respeito aos pais mas com grande ênfase no valor da gentileza, do comedimento e do altruismo. O Padre Astete faleceu em Burgos, em 1601, e está sepultado na Iglesia de San Lorenzo.

Os Estete e a conquista da América

Cerca de 70 anos antes da chegada de Don Bartolomeu, vieram para a América dois mercenários de sobrenome “Estete” ou “D’Stete”. O primeiro teria sido Martín Estete, vindo entre 1506 e 1510, que em 1525 trouxe seu parente Miguel Estete para a região onde hoje é a Nicarágua. Diante da notável semelhança fonética dos sobrenomes, é razoável supor que os Estete sejam de um ramo próximo da família original. O local de nascimento de Miguel (por volta de 1495), Santo Domingo de la Calzada, se localiza na atual província de La Rioja a poucos quilômetros de La Bureba, e era na época o extremo oriental de Castela conquistado do então Reino de Navarra. Tanto Martín como Miguel terminaram suas vidas no Perú e por isso seu sobrenome é confundido frequentemente com os “Astete”, em textos sulamericanos. Porém são claramente citados como “Estete” na literatura histórica da Nicarágua e de El Salvador, especialmente se falamos de Martín. Seus descendentes, no entanto, parecem ter desaparecido em pouco tempo pois seu sobrenome é muito menos freqüente, seja nas Américas, seja na Espanha. Mesmo os Estete modernos parecem ser descendentes dos Astete do Peru, visto que, depois da morte de Miguel, não há notícia de pessoas com sobrenome Estete até o século XX. Mesmo assim, há importantes informações históricas sobre estes dois personagens.

Martin Estete
Martin Estete consta da relação de homens que teriam vindo para América com o fidalgo andaluz Diego de Nicuesa. Nicuesa empenhou todo seu prestígio para ser nomeado em 1506 governador da Tierra firme (ou Castilla del Oro, hoje o Panamá e a Nicarágua), para lá partindo por volta de 1509 numa expedição na qual investiu toda sua fortuna na contratação de navios e soldados. Após a morte de Nicuesa em 1511, Martin permaneceu na América Central, sendo recomendado pelo Rei Carlos I em 1524 para que recebesse cargo comissionado de Pedrarias D’Ávila, o temido novo governador da “Tierra firme”, de quem se tornaria braço direito. Em 1529 fez a exploração do rio Suerre, ao norte da Costa Rica, sendo duramente combatido pelos nativos locais. Em 1530, sob ordens de Pedro Arias D’Ávila (Pedrarias por contração e por menção à ganância do governador) sitiou a cidade de San Salvador, fiel ao governador Pedro Alvarado, com a finalidade de anexa-la à governação da Nicarágua. Foi então derrotado, após longos combates, por Luís Moscoso. Em 1534 já estava no Peru e foi responsável por fazer o plano de construção, arruamento e ocupação da recém fundada cidade de Trujillo, tornando-se possivelmente o primeiro “urbanista” da América do Sul. De fato, a diagramação urbana da cidade, ao mais clássico estilo do barroco espanhol, a distingue de outras cidades do Peru. Foi sub-governador em Trujillo até se transferir para Lima, com sua mulher Maria de Escobar. Faleceu em 1537 e não se conhecem descendentes da época.


Miguel Estete
É do relato de Miguel Estete que sabemos sobre muitos dos fatos ocorridos durante a conquista do Império Inca pelos espanhóis. Nascido por volta de 1495, em Santo Domingo de la Calzada, veio para a América Central em 1525. Em 1527 acompanhou Diego Almagro na expedição que saía do Panamá para reforçar o grupo de Francisco Pizarro, que partira para explorar as terras do sul. Assistiu à fundação de San Miguel de Piúra, a primeira cidade espanhola do Peru, na mesma época em que os espanhóis tomaram conhecimento do império Inca e de sua crise política. Em 16 de agosto de 1532, Miguel Estete participou de um fato fúnebre: era um dos 20 que acompanharam Hernando Pizarro a Cajamarca, onde foi capturado o Inca
Captura de Atahualpa
Integrante da "missão diplomática" enviada por Francisco Pizarro, Miguel Estete acompanhou Hernando de Soto na visita que fez ao Inca Atahualpa, nos “baños” próximos a Cajamarca, da qual fez um famoso relato. Atahualpa veio a Cajamarca costurar um império que ameaçava se fragmentar, após a guerra civil pela sucessão do trono incaico com seu irmão Huáscar, da qual saiu vitorioso. Para lá não foram exércitos preparados para lutar, estavam presentes os líderes de várias tribos até então vassalas do Império Inca, e os espanhóis eram considerados apenas mais um grupo, do qual pouco se sabia. Cajamarca era uma cúpula diplomática. Com Huáscar capturado, interessava a Atahualpa oferecer a paz aos antigos aliados de seu irmão, e reforçar alianças de tribos com o poder de Cuzco. Francisco Pizarro se fizera anunciar como um emissário do rei castelhano e enviou tropas sob o comando de seu irmão Hernando, oferecendo apoio militar de seu grupo ao Inca. Convidado pelos espanhóis para um diálogo na praça central da cidade deserta, um excessivamente confiante Atahualpa compareceu com um séquito de nobres (os “Orejones”), deixando um exército de 30.000 soldados acampado fora da cidade. Foi em meio às discussões que os espanhóis atacaram de surpresa a comitiva real. Estete foi um dos que mais matou, atacando diretamente o grupo de Orejones que tentava proteger o Inca. Após chacinar vários nobres, atacou o próprio Atahualpa, lhe arrancando da cabeça a “Mascaipacha”, que era a insígnia real. Em seguida tentou mata-lo com golpe de sua espada, e teria conseguido se não fosse a intervenção pessoal de Pizarro, que ao impedi-lo teve a mão ferida. Atahualpa foi levado prisioneiro, e isto estimulou ambições de autonomia das tribos aliadas do antigo Império. Não sabiam que faltava pouco para também conhecerem a única lei espanhola no território de então: o fio da espada.
Conquistadores espanhóis representados na fundação de Santiago
Estete não participou da execução do Inca. Em meio às intrigas de Francisco Pizarro contra Atahualpa (se dizia que este conspirava contra os espanhóis, preparando uma vingança assim que fosse pago seu resgate), acompanhou Hernando De Soto na patrulha que iria verificar se realmente se aproximavam tropas do império para atacar o local onde mantinham o Inca em cativeiro. Não encontrando nenhum exército, voltaram, para descobrir que Pizarro havia mandado garrotear o Inca, apesar do espetacular tesouro enviado de Cuzco. Recebeu desse resgate um montante de 362 marcos de prata e 3.980 pesos de ouro. A partir de então é visto, cada vez mais, aliado aos opositores de Pizarro. Ainda assim, acompanhou Hernando Pizarro ao assalto ao templo de Pachacámac, nas vizinhanças da atual Lima, em 15 de janeiro de 1533, voltando em maio dessa expedição com um riquíssimo butin e o cacique Calicuchima prisioneiro. Seu relato deste feito foi publicado só no século XX. Em 1534 acompanhou Diego Almagro para o norte e foi designado para escolher um local para a fundação de Trujillo. Miguel Estete participou em 1535 da conquista da cidade imperial do Cuzco e da exploração de seus tesouros. Quando eclodiu o conflito com os Pizarro, foi leal a Almagro e defendeu a autoridade de Hernando de Soto. Em meio às hostilidades, viajou à Espanha na esquadra que levava os tesouros da conquista bem como os relatos da mesma, entre os quais figurava uma relação escrita por ele descrevendo inúmeros aspectos sobre a flora e fauna do novo mundo, além de dados geográficos. Já acumulava uma riqueza de 28.000 pesos de ouro e 6.500 marcos de prata. Em 1537 estava de volta ao Peru, vivendo em Lima, e em 1539 ajudou a fundar Huamanga (Ayacucho). Conta-se que, em 1557, o Inca Sairi Tupac passou por Huamanga a caminho de Lima, atendendo a chamado das autoridades espanholas. Nessa ocasião encontrou-se com Estete que entregou a ele a “Mascaipacha” de Atahualpa, talvez tentando reparar sua antiga culpa. Sairi Tupac aceitou a oferta, mas não tinha motivos para ficar feliz, visto que Atahualpa fora inimigo de sua família nas guerras civis. Miguel Estete casou-se com Doña Beatriz de Guevara e viveu em Huamanga como cidadão respeitado até sua morte. Em 1574 sua filha, Isabel de Estete, ergueu em sua memória uma capela no Mosteiro de Santo Domingo. Apesar de ter tido, segundo relatos, muitos filhos, não há registro sobre os demais descendentes de Miguel Estete, e é provável que tenham adotado o sobrenome Astete com passar do tempo.

O último século do Vice Reino do Perú e a Independência das Américas

O final do século XVIII e o início do século XIX foram marcados por sublevações e movimentos revolucionários, na Europa e no continente americano. De forma geral, tais eventos acabaram ganhando feições independentistas nas Américas, mesmo que não fosse esta sua motivação inicial. Os Astete foram, em sua maioria, ligados aos exércitos e à burocracia do Vice-Reino do Peru e leais à coroa espanhola. Porém, também participaram de sublevações e nas guerras da independência, como muitas outras famílias, viveram experiências fratricidas. Entre os documentos publicados e acessíveis pela internet encontramos citações das seguintes pessoas:

Os Astete do Cuzco

O sobrenome Astete parece bastante freqüente, hoje em dia, na região do Cuzco. Parte disto se deve ao envolvimento tradicional da família com a atividade de mineração, desde o mandato de Don Bartolomeu em Potosí. Possivelmente desta tradição surgiu ao menos um núcleo aristocrático da família Astete, na cidade do Cuzco, que teve na segunda metade do século XVIII o advogado Don Domingo Luis Astete y Mercado como seu patriarca. Atuando na Real Audiencia de Lima, e dono de grandes propriedades rurais, Don Domingo comprou uma parte do antigo palácio, que fora edificado por ordem do Inca Tupac Yupanqui (sucessor de Pachacútec) mais de 300 anos antes. O palácio havia sido transformado em Solar e dividido entre famílias aristocráticas. Os descendentes de Don Domingo viveram no solar por 200 anos, e foram sempre pessoas destacadas, no tempo do Vice-Reino, durante a emancipação e no início da República. Teve dois filhos notáveis, o Coronel Pablo Astete e o advogado Domingo Luis Astete.

Pablo Astete

O coronel do Exército Realista Pablo Astete era cuzqueño e sempre esteve ao lado da coroa espanhola. Combateu contra o levante de Tupac Amaru II, e testemunhou sua execução em 1781; Em 20 de junho de 1811 comandou uma das divisões das tropas do General Goyeneche na batalha de Huaqui, contra as forças independentistas argentinas. Esta batalha resultou em ampla derrota dos platinos, a ponto de seu exército acabar em fuga desordenada, e determinar a reconquista do território do Alto Peru para o Vice-Reino. Também combateu neste episódio, no mesmo exército, seu irmão o Tenente Coronel Domingo Luis Astete sob ordens do Coronel Pablo. Tanto o Coronel Pablo como seu irmão abandonaram o exército após a derrota de Tucumán e da capitulação de Salta, onde estiveram no comando de batalhões realistas.

Domingo Luís Astete

Natural do Cuzco, foi advogado como o pai e oficial do exército realista ao lado do irmão. Após seu afastamento do exército, em 1814, viu eclodir no Cuzco a revolta liderada pelo oficial Brigadeiro Mateo García Pumacahua, um cacique do povo Chinchero, que havia se tornado líder dos remanescentes incas e ganhado prestígio e patente militar junto à coroa espanhola. Pumacahua e os irmãos criollos Angulo haviam deflagrado a rebelião para que fosse reconhecida no Peru a carta constitucional de 1812, válida para a Espanha. Tal constituição tinha muitos itens liberais que se pensava em estender às colônias, e abolia muitas das “leis para as índias” que tanto desagradaram aos “criollos”. Com a restauração monárquica em 1814 a constituição foi abolida, e um retrocesso absolutista se anunciava. Domingo Astete apoiou o movimento inicialmente, e fez parte da junta rebelde de governo do Cuzco, como representante civil. Manteve, no entanto, um relacionamento difícil com os irmãos Angulo e com Pumacahua, tendo sido vítima de atentado ordenado por Vicente Angulo. Sobreviveu ao ataque e se afastou da participação da junta, não voltando a tal função mesmo diante dos pedidos de reconsideração por parte de José Angulo. Imediatamente se tornou claro que a revolta era um precedente que poderia significar o alastramento de um movimento independentista no Peru. Pumacahua e os Angulo se lançaram em expedições de expansão do movimento. Os insurgentes foram derrotados pelas forças do Vice-rei, o Marquês de la Concórdia, e Pumacahua e os Angulo foram executados. Depois destes incidentes, Domingo Luis Astete dedicou o resto de sua vida a defender como advogado pessoas pobres e amigos.


Campanha de Libertação - fase final

José Santos Astete

Foi um oficial do “Exército Patriota do Chile”, sob ordens de Bernardo O’Higgins, na campanha de libertação retomada após a chegada de San Martín. Em 1817 comandava tropas na fronteira norte do Chile libertado, como Capitão de Cavalaria das milicias. Foi governador militar das cidades de San Carlos e Rere e responsável pela morte do bandoleiro Antonio Pincheira, que era membro da família que aterrorizava a região com assassinatos, saques e seqüestros.

Batalha de Junín

O combate entre o exército de Bolívar e as tropas do General Realista José de Canterac foi um dos últimos episódios da derrota do Vice-Rei La Serna, o que determinou a independência do Peru. Bolívar contava com 9.000 infantes e 1.000 cavaleiros, enquanto Canterac tinha 3.000 soldados na infantaria e em torno de 1.300 da cavalaria, além de 9 peças de artilharia. Os batalhões de Canterac estavam, na verdade, isolados do corpo principal do Exército Realista, e tentavam fugir para se reagrupar ao mesmo. Em 6 de agosto de 1824, à beira do lago nos Pampas de Junín, Bolívar os alcançou. Os espanhóis atacaram com uma maciça carga de cavalaria, antes que a infantaria de Bolívar tivesse tempo de se agrupar, obrigando os cavaleiros do “Exército Patriota” a dar combate e depois tentar fugir. Porém a manobra de Canterac foi envolvida pela retaguarda e, em 45 minutos, a quarta parte dos cavaleiros reais estava morta, 80 estavam prisioneiros, e seus inimigos haviam sofrido 150 baixas.

General Canterac e Bolívar nos campos de Junín

Foi um rápido e feroz combate a 4.000 metros de altitude, travado com sabres, lanças e lutas corpo a corpo. Não foi disparado um único tiro, nem de fuzil, nem de canhão. Conta-se, em minha família, que ao lado dos realistas estava Don Rafael Astete, nosso antepassado direto (em verdade, meu tataravô) um militar nascido em Salamanca, que conseguiu escapar com as tropas restantes de Canterac, abrigando-se nos Andes. As tropas espanholas em fuga foram perseguidas pelas milícias patriotas, até as montanhas. Entre os perseguidores figuraram os coronéis Careño, Otero e Terreros, o comandante Peñaloza e o Major Justo Astete, do qual não encontrei outras informações. O fim dos realistas se daria em dezembro, na batalha de Ayacucho.


Luís Germán Astete, comandante de mar e terra.

A guerra do pacífico

Entre 1879 e 1883 o Peru conheceu algumas das mais trágicas páginas de sua história. Arrastado para a guerra por um tratado, para defender os interesses bolivianos, sofreu inicialmente graves derrotas que culminaram com a ocupação de Lima. A expulsão do invasor chileno foi penosa e no final se fez um tratado que determinou perda de territórios, aceito por um governo submisso aos chilenos. As tentativas de fazer frente às bem preparadas forças chilenas, muito superiores em termos materiais, se fizeram com inúmeras demonstrações de espírito intrépido por parte de grandes comandantes, na terra e no mar. São os principais destaques as façanhas do Almirante Miguel Grau e do General Andrés Cáceres. Companheiro de armas dos dois, combateu nessa guerra Luís Germán Astete.


Luís Germán Astete, comandante de mar e terra

Se alguém, entre os vários militares na história da família, merece o título de “herói”, este foi sem dúvida Luis Germán Astete Fernández de Paredes. Nascido em Lima em 1832, fez carreira na marinha peruana, participando de fatos políticos importantes, sempre apoiando movimentos oposicionistas. Foi também um ativo político, tendo tido um mandato de deputado provincial e de prefeito, o que o levou por vezes a se afastar da marinha. Em 1877 aderiu à causa de Nicolas Piérola contra o Presidente Mariano Ignácio Prado, tomando o comando do lendário encouraçado "Huáscar". O navio foi, sob seu comando, a principal arma dos rebeldes e chegou a entrar em combate contra dois navios da marinha britânica enviados para capturá-lo, em episódio conhecido como o "Combate de Pacocha". No meio da noite ludibriou os ingleses, mas foi obrigado a se render às forças governistas dois dias depois.

O Huáscar com os velames abertos



Combate de Pacocha,em primeiro plano a fragata inglesa HMS Shah

Na primeira fase da Guerra do Pacífico o Capitão Germán Astete foi incumbido de trazer armas e equipamentos dos Estados Unidos para auxiliar o esforço do Almirante Miguel Grau. Este sustentava um combate desigual no mar, praticamente sozinho, no comando do glorioso monitor Huáscar. A missão de Germán Astete foi interrompida quando finalmente, em 08 de outubro de 1879, o encouraçado foi cercado e capturado pelo inimigo em Angamos, acossado por 6 navios chilenos.

Convés do Huáscar após o combate de Angamos

Nele morreu o Almirante Grau, após 6 meses de verdadeiras façanhas navais, onde com um único mas poderoso navio foi capaz de paralisar toda a marinha chilena, afundando 16 navios inimigos, capturando outros 6 e bombardeando diversas posições em terra. Com a captura do Huáscar e o fim de Grau, estava selada a derrota da marinha do Peru. O Capitão Astete então voltou para esperar o inimigo comandando uma fortaleza naval no porto do Callao, do qual era também prefeito. Recebeu os primeiros navios chilenos com fogo de artilharia e viu, com tristeza, o Huáscar cercando o porto, sob a bandeira do inimigo. Em 15 de janeiro de 1881 participou da batalha de Miraflores, na desesperada defesa de Lima, à frente de 1.500 voluntários do Callao, sendo um dos últimos comandantes a ter admitido a derrota. Compreendendo que a defesa era impossível, voltou ao porto e cumpriu, na madrugada de 17 de janeiro, ordens de afundar a corveta “Unión”, o monitor “Atahuallpa” e os cargueiros “Limeña”, "Chalaco”, “Talismán”, “Oroya” e “Rímac”, antes que caíssem em mãos inimigas. Como outros oficiais da extinta marinha, entre eles Máximo Tafur, fugiu em direção à serra para se juntar ao lendário comandante Andrés Cáceres. Participou das vitórias de Marcavalle/Pucará e Concepción (09/07/1882). Foi nomeado por Cáceres comandante da 4ª Divisão do Exército do Centro, que incluía a Cavalaria e a Artilharia, em 1883. Em 10 de julho do mesmo ano, Germán Astete participou da Batalha de Huamachuco, onde morreu em combate. Nesta batalha tropas equivalentes de 1800 combatentes de ambos os lados se enfrentaram, com os chilenos colocados em posição alta, sobre o cerro Sazón, e os peruanos atacando a partir da base. Sabendo que tinha pouca munição, Cáceres tentou vencer utilizando fogo cerrado de fuzis e avançando (ao mesmo tempo expondo) a artilharia, para capturar o cume do morro antes que se acabassem os suprimentos. Quase conseguiu. Os chilenos não puderam resistir inicialmente, perderam a base e as linhas de defesa das ladeiras. Ao perceber a diminuição do fogo peruano, com as tropas ainda escalando o terreno, os chilenos sob comando do Coronel Gorostiaga contra-atacaram. Os peruanos, mesmo sob fogo e sem poder revidar, avançaram e forçaram um combate corpo a corpo para tentar evitar que fosse capturada a artilharia. A aposta tinha sido alta demais. O movimento de defesa foi, na verdade, suicida pois os peruanos não dispunham de baionetas. Morreram 800 combatentes de Cáceres, entre eles seus principais comandantes, como Tafur, Leôncio Prado e Germán Astete, que caiu ferido por disparo frontal durante o contra-ataque chileno.


O "Huáscar" hoje, como museu naval no Chile

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